Obra: Poemas do Homem do Cais.
Autor: Alcy Araújo.
Ano de publicação: 1983.
Estado: Amapá.
Onde ler: Livraria do Senado (gratuito em pdf).
Alcy Araújo foi um importante nome da produção cultural em Amapá, a partir de 1953, quando chegou na capital do Estado para trabalhar como funcionário público. Trabalhou no desenvolvimento do teatro e da imprensa especializada na divulgação cultural. Sua poesia é marcada pela descrição de desigualdades sociais e apelos para maior justiça e solidariedade entre as pessoas.
Em 2024, para celebrar o centenário do nascimento do poeta, a Livraria do Senado publicou “Poemas do Homem do Cais”, reunindo poesias selecionadas para homenagear a sua memória. Esse esforço ajuda a preservar a cultura, registrando os testemunhos de quem, a partir do cais, viu muito além do que estava à sua frente. A mensagem permanece atual e relevante.
A poesia é importante porque oferece um consolo para quem lê. Sofrer sozinho é solitário e assim é mais difícil enxergar a saída. Na verdade, sentimento nunca é de uma pessoa só. A vida é uma visita em algo bem maior do que nós mesmos. Muito veio antes e muito seguirá depois. Tudo o que fazemos deixa marcas no destino. Assim caminha a humanidade. Compartilho abaixo meu poema favorito da obra e recomendo a leitura. Ela é breve e bela, como a vida.
Poema para criar confiança
Não temas o sofrimento
de agora.
Aceita sem queixas
as lágrimas que te dou
e a oferenda de angústias
aos pés do teu amar lustral.
Como o sol se oculta
por trás da noite
pela alegria de reeditar auroras
a felicidade se oculta por trás da dor
pela alegria do depois inevitável.
Confia em meu poema.
Sou o que reservou
para o teu sonho
a música do mar
e o silêncio da rosa
quando estavam fechados
todos os caminhos.
Nada temas.
Eu tenho as mãos sortidas
de carinho.
O coração úmido
de ternura
desde que Deus inaugurou
a tua presença.
Eu sou Alcy Araújo
poeta do cais
proprietário de canções e esperanças
quando são mais nítidas
as horas de sofrer.
Confia em meu poema.
Ele preservará tuas lágrimas
e abrigará límpido
a luminosidade do teu corpo.
Obra: O Vampiro de Curitiba.
Autor: Dalton Trevisan.
Ano de publicação: 1965.
Estado: Paraná.
Onde ler: Livro impresso ou digital na Amazon (R$ 40,20 ou R$ 28,14).
Dalton Trevisan faleceu recentemente, em dezembro de 2024. Apesar do sucesso de suas obras, mantinha um perfil discreto, distante do público. Ele ganhou o Prêmio Camões em 2012, considerado o maior em Língua Portuguesa.
Sua obra mais conhecida é o livro de contos “O Vampiro de Curitiba”, que acompanha a busca incessante pelo prazer pelo personagem Nelsinho. O estilo de escrita de Dalton é objetivo e irônico. As situações beiram o absurdo e o improvável, revelando uma realidade paralela, onde as fantasias do protagonista são levadas até o último nível.
Até que ponto estamos dispostos a ir para satisfazer nossos desejos? Em quais lugares essa busca pode nos levar? O prazer pelo prazer, satisfaz ou vicia? São esses questionamentos levantados pelos contos, na minha experiência.
Conforme o livro avança, as narrativas se tornam cada vez menos deleitosas e mais asquerosas. Talvez essa seja a mensagem que Dalton queria deixar: não sinta o gosto de sangue. Isso é caminho para a degradação humana. Vampiros são aqueles que não morreram direito. A vida que eles têm é uma maldição.
“No fundo de cada filho de família dorme um vampiro – não sinta gosto de sangue” - Dalton Trevisan.
Conclusão
Enquanto Alcy se depara com a realidade de desigualdade e a enfrenta com esperança e doçura, Dalton faz crítica ao culto dos prazeres que atrai tantas pessoas para os piores lugares. São duas posturas diante das desilusões. Delas, não se pode fugir.
No entanto, existe uma convergência. Para ambos autores a felicidade não significa ausência de tristeza tampouco a realização de todos os desejos. A realização da vida jamais é ideal. Momentos felizes e tristes existem e pronto, como cada um lida com eles é o que muda.
Desejo é ausência e satisfação é instante. Tão logo satisfeito, o prazer se transforma novamente em desejo. Alcy fala de memória, dos longos momentos entre breves instantes pelos quais a vida presta. Dalton fala da ausência, do incessante anseio de tudo ao mesmo tempo agora, degradante.
Ser feliz é ter calma.
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