Uma das primeiras fases da criança que começa a desenvolver consciência e cognição é aquela dos “por quês?”. Filhotes humanos são os únicos que questionam seus pais sobre tudo que não compreendem. Outros animais, ainda que tenham sistemas de comunicações próprios, desconhecidos por nós, tem comportamentos instintivos, não racionais. Não lhes interessam os “por quês?” (considerando o limite do que conhecemos, mas podemos estar equivocados).
Para muito dos “por quês?” os pais não tem respostas, ou apenas não julgam que seja o momento certo de explicá-los aos filhos. Eu me lembro de perguntar a uma tia: “por que o céu é azul?”. A resposta dela foi: “porque ele reflete a cor do mar”. Eu continuei o questionário: “E onde não tem mar? O céu muda de cor?”. Ela respondeu que como o planeta possui mais mar do que terra, o azul predomina. Fiquei satisfeita. Naquela época, não existiam Smartphone, uma resposta mais elaborada e mais correta demandaria uma visita à biblioteca e algumas horas de pesquisa. Assar um bolo de nozes era a prioridade naquele dia.
Até hoje não sei bem ao certo por que o céu é azul, mas sei que existe uma relação com a forma que a luz é refletida na atmosfera. Também sei que essa é uma pergunta muito mais complexa do que a princípio aparenta. Uma criança provavelmente não entenderia as explicações da física sobre tal fenômeno. Ainda assim, a explicação que minha tia me deu foi satisfatória por muito tempo. Ela não reprimiu minha dúvida com indiferença nem me desencorajou a questionar apenas por eu ser muito jovem. Pode ser que ela também não soubesse a resposta exata. Mesmo assim, parte de sua intuição estava certa: cores são reflexos, não do céu, mas da luz. A maior e mais importante delas é o sol. Para nós, ele fica de fato no céu. Em sentido amplo, a resposta dela não estava completamente errada.
Tive o privilégio de crescer em um ambiente em que a dúvida era bem recebida e o estudo, incentivado. Seria muito pior se os meus “por quês?” fossem eliminados desde cedo e eu incentivada a aceitar o mundo como ele é, sem questionar. Os “por quês?” são nossa busca por propósito. Quando adultos tendemos a deixá-los de lado, por conveniência ou falta de prática. A partir de então, a vida vai perdendo a cor; o céu vai ficando cada vez mais cinza.
Ser indiferente pode atrair os que muito já sofreram buscando respostas. Inclusive, tende a ser uma opção confortável. Por outro lado, limita absurdamente nossa experiência de vida. Condena-nos ao papel de figurantes em um filme com muitos mistérios a serem explorados. Um filme que tem espaço para quantos protagonistas existirem.
Ainda me incomodam muito os “por quês?” e alguns “porque” também. Essa forma de "existência intrigante", às vezes, pode ser bem desgastante. Porém, sempre interessante. Sem eles, não há razão. Se tudo fosse absoluto, não poderíamos atuar, apenas reproduzir a mesma história de sempre em sempre.
Achei pertinente terminar esse post com um convite para você escutar essa música e, caso ainda não conheça, desfrutar do talento de Tulipa Ruiz: "fique mais um pouquinho e aprenda alguma coisa nessa parte do caminho".