Diferente do centro de São Paulo, Rio de Janeiro ou Belo Horizonte, todas grandes capitais; em Brasília há poucas padarias com balcão para sentar. As quadras comerciais são organizadas em blocos, com varandas de circulação ao redor, ao menos no Plano Piloto. Os cafés e padarias aproveitam desses espaços (e de outros puxadinhos, regulares ou não; afinal, Brasília é uma ilha, mas ainda é brasileira), para colocar mesas e cadeiras exclusivas aos clientes.
No centro da capital, consome-se muito café: nas repartições e nas cafeterias especializadas, com grãos premiados. Cabe ressaltar que uma fazenda do DF ganhou o prêmio Illy de melhor café do Brasil, em 2019. Motivo de muito orgulho para quem do Cerrado é nativo. De forma a permitir a devida apreciação desses cafés, põe-se as mesas.
Talvez por isso seja difícil conhecer pessoas novas. Nos balcões das padarias de outras cidades grandes, divide-se o espaço da refeição; faz-se o pedido direto para quem o prepara, não ao atendente. Ao som de rádio ou televisão ligada, conversas espontâneas surgem, amizades se formam, amantes se conhecem.
Em Brasília, vai-se aos cafés já acompanhado. Ou então sozinho, mas para ficar sozinho mesmo, entretido consigo. Difícil alguém ir aos cafés em busca de gente nova.
Em um sábado qualquer, duas pessoas chegaram a um café para provar da especialidade preferida do cardápio de uma delas, por ocasião do seu aniversário. Depois de acomodados em uma mesa, foram abordados por uma vendedora ambulante de cadernos personalizados, de capas criativas e citações célebres da música e da literatura. Bons leitores que eram, compraram. Trocaram mensagens, para inaugurar a folha inicial da nova aquisição. Porém, restavam ainda todas as demais folhas em branco. Para que serviria aquele caderno analógico no mundo digital contemporâneo?
Em mesa próxima, um senhor de idade avançada fazia registros em um caderno parecido com os que acabavam de ser adquiridos pelos vizinhos. As duas pessoas começaram a cogitar o que estava sendo escrito, em busca de inspirações. Elaboraram hipóteses. Decidiram registrá-las em crônicas, no novo caderno, para depois comparar.
Em Brasília, é muito difícil fazer amizades, por falta de balcões nas padarias e cafés.
Nenhuma hipótese satisfez a uma dessas pessoas, que então passou a usar seu caderno para registrar notas de reuniões enfadonhas. Pensou que deveria voltar ao café, na esperança de encontrar novamente aquele senhor, pedir licença para sentar consigo em sua mesa, e perguntar se poderia saber o que ele estava a escrever em seu caderno, pois precisava de inspiração para uma crônica prometida a alguém.